segunda-feira, 8 de março de 2010

A Paideia de Paulo de Tarso: a perspectiva de Werner Jaeger

«Sou judeu, nascido em Tarso da Cilícia, mas fui educado nesta cidade, instruído aos pés de Gamaliel, em todo o rigor da Lei dos nossos pais e cheio de zelo pelas coisas de Deus, como todos vós sois agora.»
(Act 22, 3)


Werner Jaeger considera na sua obra Cristianismo Primitivo e Paideia Grega (Ed. 70) que o processo de cristianização do mundo de língua grega dentro Império romano significou ao mesmo tempo a helenização do Cristianismo (Cfr., p.16). Neste sentido, o uso da língua nos escritos do Novo Testamento e continuado nos tempos pós-apostólicos não é irrelevante, uma vez que determinou conceitos, categorias de pensamento, e subtis metáforas que enformam o pensamento cristão (Cfr.p.17).
Jaeger apresenta como tese a paideia do Cristianismo primitivo, e partindo dos Actos dos Apóstolos, também de São Paulo, pois parecem não existir dúvidas quanto à influência da tradição grega no cristianismo, e consequentemente, em São Paulo (Cfr., p.14). Na verdade, foi mesmo esta que possibilitou a expansão do cristianismo face à sua pretensão de universalidade (Cfr., p.16).
Werner Jaeger considera que foi na cidade grega de Antioquia (onde pela primeira vez os seguidores de Cristo são apelidados de christianoi) que os judeus helenizados encontraram o terreno propício para o desenvolvimento da missão cristã, pois o grego era a língua falada em todas as sinagogas do mediterrâneo (Cfr., p.19). Ora, é neste contexto que se desenvolve toda a actividade missionário de São Paulo (Cfr.p.19). Na verdade, todas as discussões com os judeus a quem se dirigia nas suas viagens eram feitas em grego e mediante a argumentação lógica grega, e quer uns quer outro citavam a Sagrada Escritura não no original hebraico mas usando para o efeito a tradução grega dos Setenta (Cfr., pp.19-20).
Jaeger defende mesmo que São Paulo, para dialogar com os que se encontravam em Atenas pregando no Areópago, escolheu a tradição filosófica grega, que constituía a parte mais representativa do que estava vivo na cultura grega da altura, pois segundo Werner Jeager ele cita o verso de um poeta grego quando afirma que «Somos da sua estirpe», sendo que a maioria dos seus argumentos são estóicos e têm um objectivo apologético e parenético (Cfr., pp. 24-26).
No entanto, a paideia cristã posterior a São Paulo (Clemente de Alexandria, Orígenes…) visa a superação da paideia grega, pois como afirma Jaeger os Padres não negam «(…)o valor dessa tradição, mas afirmam que a sua fé cumpre tal missão paidêutica da humanidade num grau mais elevado do que antes fora alcançado» (p.84), uma vez que «A verdadeira paideia é a religião cristã propriamente dita» (p.85), mesmo que haja uma fusão entre ambas as tradições, pois tal fusão havia sido «prenunciada já no discurso de Paulo em Atenas nos Actos» (p.86), existe no entanto a sua superação cristã, pois, «Ao tomar esta cultura internacional por base, o Cristianismo tornava-se agora a nova paideia que tinha por fonte o próprio Lógos divino, o Verbo que criara o mundo» (p.87).
Ainda que não seja o objectivo principal de Werner Jaeger tratar a questão da influência helénica em São Paulo, a verdade é que ela está afirmada e devidamente sustentada ao longo desta obra tal como resumidamente fizemos questão de apresentar. Sem dúvida que esta obra, completada com a obra maior de Werner Jaeger sobre a educação do homem grego – Paideia – apresentam-se como incontornáveis para a recta compreensão da influência do pensamento helénico no cristianismo primitivo e que vem até ao nossos dias.

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