quinta-feira, 27 de maio de 2010

Paulo, mestre no diálogo ecuménico e no diálogo inter-religioso?

Posso não ter chorado ao ler a Carta aos Romanos, mas não fui insensível a tantos aspectos que me ajudaram a penetrar mais a fundo no mistério cristão e, consequentemente, no mistério da Igreja que S. Paulo tanto se esforça por elucidar.
Um dos aspectos que mais me fez reflectir foi, de facto, a forma como Paulo coloca em plano de igualdade todos os homens, rejeitando a ideia de um privilégio salvífico circunscrito a uma etnia ou a um determinado grupo religioso. Não podemos esquecer do legado judaico de Paulo e da multiplicidade de mundividências com as quais se viu confrontado. Paulo ousou abrir as portas do Céu mesmo àqueles que estariam, à partida, excluídos pela Lei (neste sentido faz sentido recordarmos a promessa de Jesus ao Bom Ladrão).
Estas premissas levam-me a pensar a forma como encaramos o diálogo ecuménico e o diálogo inter-religioso. Será que esta abertura paulina é seguida também por nós, católicos, que nos dizemos herdeiros do seu pensamento e sistematização teológica e moral? Penso que há um longo caminho a percorrer. Muitas vezes somos invadidos pela prepotência e pelo orgulho de nos considermos donos da verdade, como portadores exclusivos da salvação, como juízes da história das demais confissões religiosas. Aprisionamos o desígnio e a misericórdia de Deus segundo as nossas medidas e obstaculizamos os "outros" que não partilham a mesma fé ao acesso à salvação, cujo bilhete pensamos ser adquirido às portas do Vaticano. Não duvido que esta é a verdadeira Igreja de Cristo, a «una, santa, católica e apostólica», mas não posso de comungar da mesma opinião de Paulo, ao afirmar que a promessa é para todos, e o pecado é de todos. Logo, todos estamos subordinados à misericórdia de Deus, todos somos atingidos, de igual forma, pela acção salvífica de Cristo, pelo que não nos cabe a nós delimitar as fronteiras da salvação e da condenação.
É curioso verificar como Paulo, e o Papa Bento insiste nisso na catequese 14, afasta o Cristianismo do moralismo. Vejo como muitos dos nossos paradigmas linguísticos estão longe desta realidade. Falamos mais do Inferno do que do Céu, falamos mais do pecado do que da graça, falamos mais do mal do que do bem. Quem está em Cristo é uma nova criatura, diz Paulo. Esta é a sua mensagem central, e se isso torna-se realidade encarnada na vida do cristão, tudo o resto é supérfluo. A vida cristã define-se pela existência em Cristo, na sua dimensão baptismal e eucarística, e não pelo horror ao que dela se afasta. As imagens do Inferno e de outras realidades similares não podem ser ignoradas, mas não devem estar no centro da mensagem, no horizonte único da pregação, no modus vivendi do cristão. O kerygma pascal e a certeza do Espírito em nós são os únicos motores que impelem o cristão a mudar de vida e a converter-se permanentemente ao Evangelho de Cristo. Tudo o resto é "esterco", como o próprio diz.
Desculpem a divagação.

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