terça-feira, 15 de junho de 2010
3 – Paulo: tem dores de parto – Gal 4, 19
“τέκνα μου, οὓς πάλιν ὠδίνω μέχρις οὗ μορφωθῇ Χριστὸς ἐν ὑμῖν·”
“Meus filhos, por quem sinto outra vez dores de parto, até que Cristo se forme entre vós!”
O apóstolo neste quarto capítulo da Carta aos Gálatas continua à temática do capítulo anterior na medida em que continua a ensaiar perspectivas no sentido de recuperar os Cristãos que haviam sido influenciados pelos cristãos judaizantes. Neste sentido neste capítulo Paulo escreve-lhes várias teses no sentido de os ajudar: a grande novidade do Evangelho supera toda a lei (vv. 1-7); relembra a mudança feliz que foi a conversão de cada um a Cristo (vv. 8-11); o afecto que a comunidade lhe (a Paulo) dedica e à sua missão (vv. 12-16); o carácter negativo dos que os haviam tentado perverter (vv. 17-18); na secção que estudamos agora com mais pormenor, o afecto do Próprio Paulo pela comunidade (vv. 19-20); este capítulo termina, então, com uma argumentação bíblica, no sentido explicar a primazia de Cristo sobre a lei a partir da própria lei.
Este sofrer dores de parto (ὠδίνω) assume portanto, desde já um duplo significado. Por um lado Paulo sofre no sentido em que os seus filhos espirituais, eles mesmos lhe causam dor no seu nascimento difícil para a fé. Por outro lado reconhece, tal como num bebé, a fragilidade e a exposição dos destes filhos de tenra idade espiritual a ataques e parasitas exteriores. Paulo mostra, ao mesmo tempo, o exemplo àqueles aos quais são encarregues comunidades: que sejam pais diligentes, considerando os membros da sua comunidade crianças de tenra idade, no sentido de as proteger e exortar.
Importante ainda o facto de Paulo dizer que este nascimento só se completa na medida em que Cristo se forma na comunidade. Estamos portanto perante uma gradação no crescimento espiritual, pessoal e comunitário. Note-se que o advérbio πάλιν indica que Paulo sofre “outra vez” as dores de parto, como dando a conhecer que já as tinha sofrido provavelmente aquando da fundação da comunidade. “Como fundador apostólico da comunidade, ele sofre pelos Gálatas”.
Raymond Collins diz-nos que Paulo escreve estes dois versículos aos dizendo o que uma mãe desgostosa diria aos seus filhos: “just before his exposition of the Sarah-Hagar allegory, Paul writes to the Galatians as a frustrated mother might do: “My little children (teknamou), for whom I am again in the pain of childbirth (odino) until Christ is formed in you, I wish I were present with you now and could change my tone, for I am perplexed about you” (4:19-20)”. Como continua a explicar este autor, embora a imagem maternal continue presente, aqui distanciamo-nos bastante da imagem que encontramos na primeira carta aos Tessalonicenses: em 1Tes 2, 7-8 Paulo usa a imagem para mostrar o seu afecto pela comunidade a que escreve; em Gal 4, 19 usa esta metáfora para falar do sofrimento causado pela comunidade. Esta imagem ganha mais força se considerarmos: por um lado Paulo sente “outra vez dores de parto” (πάλιν ὠδίνω); por outro são dores de parto prolongadas “até que…” (μέχρις) Cristo se forme entre eles.
Consultar:
Consultar:
SÁNCHEZ BOSCH, Jordi, Escritos paulinos, Editorial Verbo Divino, Estelha 1998.
RICHARD, Earl J. First and Second Thessalonians, Sacra Pagina, Minnesota 2007.
COLLINS, Raymond F., The Power of Images in Paul, The Liturgical Press, Minessota 2008.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, RIGATO, Maria Luisa , MILITELLO, Cettina, Paulo e as Mulheres, Edições Paulinas, Prior Velho 2009.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, Pablo, su historia, San Pablo, Madrid 2008.
2 – Paulo: amamenta os bebés – 1Cor 3, 1-2
“Κἀγώ, ἀδελφοί, οὐκ ἠδυνήθην λαλῆσαι ὑμῖν ὡς πνευματικοῖς ἀλλ᾽ ὡς σαρκίνοις, ὡς νηπίοις ἐν Χριστῷ. γάλα ὑμᾶς ἐπότισα, οὐ βρῶμα, οὔπω γὰρ ἐδύνασθε. ἀλλ᾽ οὐδὲ ἔτι νῦν δύνασθε,”
“Quanto a mim, irmãos, não pude falar-vos como a simples homens espirituais, mas como a homens carnais, como a criancinhas em Cristo. Foi leite que vos dei a beber e não alimento sólido, que ainda não podíeis suportar.”
Este terceiro capítulo é especialmente exemplo do desagrado que Paulo sente perante a carnalidade pecaminosa dos Coríntios que se manifesta de forma visível nas suas divisões internas. Neste capítulo portanto, Paulo, faz questão de apontar o que está errado entre os Coríntios: lembra aos ministros que eles não são mais do que isso mesmo (v. 5); lembra que todos os membros da comunidade são iguais (vv. 6-10); lembra que a comunidade de indivíduos se construiu a partir do mesmo fundamento (vv. 11-15). Exorta portanto a que cada membro desta comunidade honre o seu corpo mantendo-o puro (vv. 16-17) e seja humilde. Termina afirmando novamente que os ministros não deverão ser especialmente exaltados, no sentido de serem vistos acima dos restantes membros da comunidade.
Apesar deste capítulo conter, portanto, este tom correctivo, impressiona ver como Paulo se dirige aos leitores. Estamos aqui perante a imagética maternal mais uma vez, porém desta vez assume uma tonalidade diferente, na medida em que Paulo diz que amamentou a comunidade constituída por criancinhas/bebés (νηπίοις), qual mãe. Diferentemente da primeira carta aos Tessalonicenses, Paulo justapõe as imagens de “pai” e “mãe” para falar da sua relação com a comunidade de Corinto. Note-se ainda que esta metáfora familiar começa logo pelo pronome ἀδελφοί (irmãos/irmãs). Mas de forma repentina Paulo pede estes seus Irmãos se considerem criancinhas vendo em Paulo a mão que os alimenta com o que eles são capazes de integrar ao seu nível.
É ainda muito interessante esta metáfora gastronómica de Paulo, criando um contraste entre leite (γάλα) e alimento sólido (βρῶμα), o qual os Coríntios não serão capazes de digerir. Vários comentadores procuraram dar a sua explicação, por seu lado Raymond Collins escreve: “Since Paul does not propose two tiers of membership in the church or two levels of preaching and acceptance of the gospel message, any pursuit of specific references for “milk” and “solid food” seems to be inconsistent with his thought. Paul, moreover, does not say that he has provided solid food to anyone. The pursuit of specific references for milk and solid food is unwarranted and deprives Paul’s metaphor of its rhetorical force. The contrast between milk and solid food enhances Paul’s metaphorical description of the Corinthians as mere infants. Proclaiming themselves to be fully mature, they are really like infants who can only drink milk, incapable as they are of eating solid food”. O próprio verbo usado por São Paulo “ter dado de beber” (ἐπότισα) “leite” (γάλα) mostra precisamente este amor maternal do apóstolo.
Este mesmo autor explica que por outro lado o facto de Paulo se considerar mãe da comunidade vai ao encontro da outra imagem que ele apresenta de si mesmo: servo dos seus irmãos em Cristo. E esta palavra “servo” que em grego é tão rica, até porque dependendo do contexto, se diz de forma diferente: dialkonos (servidor litúrgico); doulos (escravo); hyperetes (servo em sentido mais militar); oikonomous (gestor, mais a nível económico).
Portanto, neste ambiente de dura correcção da comunidade de Corinto, Paulo continua a mostrar o laço de afecto e preocupação que caracterizam a relação com a comunidade. Simultaneamente através destas imagens afasta-se a ideia de uma frieza radical de Paulo, mesmo em duros momentos como este.
Consultar:
SÁNCHEZ BOSCH, Jordi, Escritos paulinos, Editorial Verbo Divino, Estelha 1998.
RICHARD, Earl J. First and Second Thessalonians, Sacra Pagina, Minnesota 2007.
COLLINS, Raymond F., The Power of Images in Paul, The Liturgical Press, Minessota 2008.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, RIGATO, Maria Luisa , MILITELLO, Cettina, Paulo e as Mulheres, Edições Paulinas, Prior Velho 2009.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, Pablo, su historia, San Pablo, Madrid 2008.
Paulo: aia – 1Tes 2, 7
“δυνάμενοι ἐν βάρει εἶναι ὡς Χριστοῦ ἀπόστολοι. ἀλλὰ ἐγενήθημεν νήπιοι ἐν μέσῳ ὑμῶν, ὡς ἐὰν τροφὸς θάλπῃ τὰ ἑαυτῆς τέκνα”
“Quando nos poderíamos impor como apóstolos de Cristo, fomos, antes, afectuosos no meio de vós, como uma mãe que acalenta os seus filhos quando os alimenta.”
Neste segundo capítulo da primeira carta de Paulo aos Tessalonicenses vemos o à-vontade com que Paulo se dirige a esta comunidade. Esta confiança é acompanhada ainda de um sentimento mútuo de integridade no seguimento do caminho do Senhor. Como muitos especialistas analisam, esta carta não pretenderia transmitir muitos conteúdos aos cristãos em Tessalónica. Pretendeu sim, mostrar uma proximidade e presença espiritual de Paulo junto à comunidade: “ (…) Por eso, en Primera Tesalonicenses, la primera carta que debió de escribir, el apóstol no tiene interés en comunicar grandes novedades, sino en infundir ánimo y responder a las preguntas planteadas, a la luz de la doctrina anteriormente transmitida”.
Neste sentido Paulo apresenta-se ele mesmo como modelo na medida da sua sinceridade e integridade, tal como a dos seus colaboradores. Paulo acredita, e escreve-o, que a sua fé sincera é a chave do seu sucesso. Portanto, também os ministros da Palavra terão tanto mais sucesso quanto Ela tomar vida nas suas próprias vidas. Claro que, como em todos os escritos paulinos, Paulo afirma a primazia de Jesus sobre tudo o seu trabalho, Ele é o verdadeiro centro à volta do qual as comunidades devem gravitar. Neste sentido Paulo defende que a sua autoridade lhe vem de Jesus e logo reclama a paterninade, melhor, a maternidade das comunidades.
Vejamos, porém, que a partir de algumas traduções e lexicos que a palavra grega τροφός significa não uma mãe biológica mas “mãe adoptiva”, uma aia. Portanto esta palavra está impregnada de simbolismo. Este termo remete-nos para uma figura maternal, que não sendo a mãe biológica, alimenta os seus filhos adoptivos como se fossem dela própria. Aliás, se analisarmos racionalmente esta imagem de São Paulo ela é incongruente no sentido em que fala de uma mãe adoptiva (τροφός) que cuida dos seus próprios filhos (νήπιοι ὑμῶν). Neste sentido percebemos que Paulo mostra que na realidade estes “filhos” não são dele mas de Jesus, porém Paulo ama-os como se fossem dele próprio. Esta imagem portanto está impregnada de carinho e de cuidado afectuoso.
Digno de nota é ainda o verbo que descreve esta acção maternal de Paulo no conjuntivo presente activo θάλπῃ. Este verbo literalmente significará “manter aquecido”, como um pássaro mantém quentes os seus ovos.
Reconhecemos, portanto, como Raymond Collins que as imagens usadas por São Paulo são poderosíssimas. Neste caso este autor explica que a palavra νήπιοι que Paulo usa para descrever os seus colaboradores será a mais comummente aceite (outros autores chegaram a defender que seria ήπιοι no sentido em que esta significa “gentios”). Esta palavra portanto destina-se à intensificação da imagem usada por Paulo, pois significa filhinhos ou criancinhas. Neste sentido, igualmente se mostra a proximidade e o conhecimento profundo que a comunidade de Tessalónica e São Paulo partilhavam.
Recordemos, então, que no momento em que Paulo se encontra em Atenas ele lembra-se da comunidade de Tessalónica, temendo o seu enfraquecimento na fé, pelo que lhes dirige esta carta carinhosa. Como bem nos diz Jerome Murphy-O'Connor: “La principal preocupación que tendría Pablo era, sinduda, por los conversos que había dejado atrás en Tesalónica. No había razón para pensar que los cristianos de allí fueran a escapar de la persecución que él mismo había evitado gracias a la huida. No temía que los tesalonicenses fueran a ceder por las presiones físicas de sus vecinos (1Tes 2,14): el verdadero peligro residía en otra circunstancia, bastante más sutil. Pablo conocía el modo de pensar de sus conversos. Estos creían, con cierta ingenuidad, que por su nueva condición quedarían a salvo de la violencia endémica que les había precedido en su anterior condición de pobres obreros. Pablo temía que cundiera la desilusión, que sobreviniera una decepción tan grande como para hacerles renegar de su nueva fe. Si los creyentes de Tesalónica llegaban a sentirse estafados, seguramente todo estaría perdido”.
Algumas fontes a consultar:
SÁNCHEZ BOSCH, Jordi, Escritos paulinos, Editorial Verbo Divino, Estelha 1998, p. 58.
RICHARD, Earl J. First and Second Thessalonians, Sacra Pagina, Minnesota 2007, pp82-83.
COLLINS, Raymond F., The Power of Images in Paul, The Liturgical Press, Minessota 2008, pp. 17-18.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, RIGATO, Maria Luisa , MILITELLO, Cettina, Paulo e as Mulheres, Edições Paulinas, Prior Velho 2009.
MURPHY-O'CONNOR, Jerome, Pablo, su historia, San Pablo, Madrid 2008, pp. 131-132.
Comparação Fil 2, 6-11 e 3, 4-11
Fil 2, 6-11
6Ele, que é de condição divina,não considerou como uma usurpação ser igual a Deus; 7no entanto, esvaziou-se a si mesmo, tomando a condição de servo. Tornando-se semelhante aos homens e sendo, ao manifestar-se, identificado como homem, 8rebaixou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz. 9Por isso mesmo é que Deus o elevou acima de tudo e lhe concedeu o nome que está acima de todo o nome, 10para que, ao nome de Jesus, se dobrem todos os joelhos, os dos seres que estão no céu, na terra e debaixo da terra; 11 e toda a língua proclame: "Jesus Cristo é o Senhor!", para glória de Deus Pai.
Fil 3, 4-11
4ainda que eu tenha razões para, também eu, pôr a confiança precisamente nos méritos humanos. Se qualquer outro julga poder confiar nesses méritos, eu posso muito mais: 5circuncidado ao oitavo dia, sou da raça de Israel, da tribo de Benjamim, um hebreu descendente de hebreus; no que toca à Lei, fui fariseu; 6no que toca ao zelo, perseguidor da Igreja; no que toca à justiça - a que se procura na lei - irrepreensível. 7Mas, tudo quanto para mim era ganho, isso mesmo considerei perda por causa de Cristo. 8Sim, considero que tudo isso foi mesmo uma perda, por causa da maravilha que é o conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor: por causa dele, tudo perdi e considero esterco, a fim de ganhar a Cristo 9e nele ser achado, não com a minha própria justiça, a que vem da Lei, mas com a que vem pela fé em Cristo, a justiça que vem de Deus e que se apoia na fé. 10Assim posso conhecê-lo a Ele, na força da sua ressurreição e na comunhão com os seus sofrimentos, conformando-me com Ele na morte, 11para ver se atinjo a ressurreição de entre os mortos.
O trabalho pedido numa aula (já longínqua…) era relacionar estas duas passagens da Carta aos Filipenses.
São dois maravilhosos textos de São Paulo, que contrapõem duas situações: a glória e o rebaixamento. E como essas duas realidades, em Cristo, têm entre si um nexo indispensável. Temos duas figuras em paralelo: no primeiro, Jesus Cristo, no segundo, São Paulo. E Paulo vai servir-se precisamente dessa ligação para legitimar a sua acção. De facto, a vida do verdadeiro cristão só pode ter como modelo Jesus Cristo. Só à luz dele o homem se compreende. ~
Como afirma a Gaudium et Spes “Na realidade, o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente” (nº 22). Se de Jesus Cristo, Paulo afirma que não se valeu da sua igualdade com Deus, de si próprio Paulo afirma não se valer dos seus méritos (o facto de ser um judeu exemplar). Em Jesus Cristo assistimos a um abaixamento até à condição humana e, aí, até à morte de cruz. Já São Paulo afirma de si que, por causa de Cristo, considera tudo o que tinha e era como esterco, uma vez que perante o conhecimento de Cristo, nada mais, por melhor que seja, se pode igualar a Jesus Cristo.
No capítulo 9 vai mais uma vez apresentar a sua tese da justificação pela fé em Jesus Cristo e não pela Lei. Paulo é o advogado da universalidade do cristianismo, realidade que não distingue os que vêm do judaísmo ou do paganismo, mas que a todos acolhe. Como afirmará Paulo na Carta aos Romanos: “É que em Deus não existe acepção de pessoas” (2,11).
Por fim, é importante notar como é central no pensamento paulino a referência ao Jesus crucificado, morto, que é o Senhor Ressuscitado. Isso é evidente no Hino cristológico e não deixa de o ser em Fil 3, 10-11. De facto, Paulo quer imitar Jesus; melhor, quer-se conformar à sua imagem, naquilo que são os sofrimentos e a morte, para assim alcançar a Ressurreição. O verdadeiro conhecimento de Jesus é o deixar-se converter por Cristo, “viver em Cristo” na experiência concreta da vida.
Mimética de Cristo por S. Paulo
Foi interessante descobrir a partir de Fil 2, 6-11 e Fil 3, 1-11 como São Paulo se afirma a ele mesmo um imitador de Cristo, a partir da própria condição de vida assumida.
Por um lado, como vemos na imagem, fala-se do status. Cristo que era de estatuto divino e Paulo que pertencia aos “escolhidos”, era um Hebreu. Depois, como os textos nos descrevem, estes personagens passam por um movimento kenótico (de perda, de esvaziamento de si mesmos). Ainda, mais vão até à humilhação nesse movimento de “sair de si”. Porém, em cada um deles acontece uma elevação, Cristo por Deus e Paulo por Cristo.
Portanto, é a partir desta imitação de Cristo que o Homem se torna verdadeiramente Cristão. Contudo, à semelhança de Cristo deve ser capaz deste movimento kenótico.
Mística em São Paulo
Neste pequeno post acompanhamos um pouco o pensamento de A. Achweitzer e de alguns conteúdos da exposição das aulas.
Realmente a mística em São Paulo parece ser um tema reavivado por alguns autores ultimamente pois torna-se um tema fundamental no conhecimento de Paulo e na aproximação às primeiras comunidades cristãs.
Resumidamente poderíamos dizer que a antropologia paulina define o Homem como aquele que é encontrado por Cristo, reencontrando-se a si mesmo. Este que é um processo vital e gradual. Aqui será portanto um dos pontos de partida para uma positiva resposta positiva à pergunta moderna: “podemos encontrar um Paulo místico?”.
A. Achweitzer foi realmente um autor de grande importância neste sentido ao reavivar o “Paulo dos milagres”, “mestre de caminhos espirituais” e de “vida contemplativa”. Paulo será então um alquimista que mistura o seu discurso retórico com uma mística subtil mas profunda. Realmente Paulo é um místico na medida em que continuamente concretiza a presença contínua do divino.
O cristianismo paulino “democratiza-se” fazendo-se imprescindível a mística, começando logo pela radicalidade do “ser enxertado” em Cristo pelo Baptismo.
Alguns exemplos são necessários aqui. Desde logo a revelação no caminho de Damasco (cf. Gal 1, 15 e 1Cor 9, 1) foi provavelmente a experiência mística mais poderosa tida por Paulo, sendo que esta nunca mais terminou mas se prolongou em toda a sua vida. Os relatos que Paulo nos faz desta cristofãnia são diferentes dos que encontramos em Actos (Act 9, 1-25; 22, 1-21; 26, 1-23), em Gálatas, por exemplo, é uma experiência mística na interioridade.
Por outro lado Paulo fala do dom das línguas que ele mesmo tem: significará a partir de uma grelha mística a possibilidade de compreender transmitir o rumor da presença de Deus de forma mais universal. Claro que Paulo não se centra neste dom como a sua razão de evangelizar, mas é um dos instrumentos importantes.
Porém, sem dúvida o grande centro da mística Paulina é o ser em Cristo (ἐν Χριστῷ). Cristo que pela condição Baptismal é o alicerce de toda a comunidade, sendo a cabeça de um corpo de cristãos unidos pela graça de Deus. Esta presença de Cristo é portanto uma presença de reciprocidade na medida em que é sempre uma presença fundadora.
Esta mística do ser em Cristo justifica-se porque Ele é a verdadeira imagem de Deus. Ele que se deve formar em cada Cristão (cf. Gal 4, 19). O mimetismo de Cristo pelos cristãos é então a meta santa cujos frutos da corrida se manifestam ao longo do percurso. A mística de Paulo pelo chamada ao ἐν Χριστῷ é uma invasão da história.
Concluindo com um último ponto: este Paulo místico tinha como meta sem dúvida o conhecimento da profundidade de Deus. Esta meta para a qual Paulo correu no sentido de chegar primeiro como a correr num estádio – chegar primeiro ladeado dos “santos”, todos a chegar em primeiro lugar. Estamos aqui perante uma democratização da mística, embora esta conheça uma gradualidade (profundidade). O Deus procurado na história pelo Homem é Cristo, o Senhor.
Fontes:
Aulas e SCHWEITZER, Albert, The mysticism of Paul the apostle. NewYork, Seabury Press, 1968.
Síntese das cartas de Paulo
- Data e local: Corinto, 56/57 ou 57/58
- Nº capítulos: 16
- Data e local: Éfeso, 55
- Nº capítulos: 16
- Data e local: Macedónia, c. 57
- Nº capítulos: 13
- Data e local: provavelmente em Éfeso no ano 54
- Nº capítulos: 6
- Data e local: Roma, c. 63
- Nº capítulos: 6
- Data e local: se foi em Éfeso, é de 54 a 57; se foi em Corinto, é do ano 50; se foi em Cesareia, é de 58 a 60; se foi em Roma, é depois do ano 60
- Nº capítulos:4
- Data e local: Roma, c. 61-63
- Nº capítulos: 4
- Data e local: Corinto, 50
- Nº capítulos: 5
- Data e local: Corinto (?), c. 51 (?)
- Nº capítulos: 3
- Data e local: Macedónia (?), c. 65-66 (?)
- Nº capítulos: 6
- Data e local: Roma, c. 66-67
- Nº capítulos: 4
- Data e local: local incerto, c. 65-66 (entre o primeiro cativeiro e a sua morte)
- Nº capítulos: 3
- Data e local: Roma, c. 61-63
- Nº capítulos: 1
As Viagens Missionárias:
A jovem e florescente igreja de Antioquia resolve enviar a Barnabé e a Paulo como missionários. O primeiro porto de escala na primeira viagem missionária foi Salamina, na ilha de Chipre, terra natal de Barnabé. Este fato, juntamente com a frequente apresentação que a Bíblia faz desses missionários como “Barnabé e Saulo” indica que Paulo desempenhava papel secundário. Esta era a viagem de Barnabé; Paulo exercia o segundo posto de comando, e os dois tinham “João [Marcos] como auxiliar” (At 13:5).
O êxito de seus esforços missionários nessa ilha incentivaram Paulo e seus parceiros a avançar para território mais difícil. Fizeram uma viagem mais longa por mar, desta vez até Perge, já em terras continentais da Ásia Menor. Dali Paulo pretendia viajar pelo interior numa missão perigosa até à Antioquia da Pisídia.
Mas, exactamente neste ponto, aconteceu algo que causou muita dor de cabeça aos três. O ajudante, João Marcos, “apartando-se deles, voltou para Jerusalém” (At 13:13), onde morava. A Bíblia não nos diz por quê, embora seja natural conjecturar que lhe faltaram coragem e confiança. A súbita mudança dos planos de Marcos causaria, mais tarde, conflito entre Paulo e Barnabé.
Em Antioquia, Paulo tomou-se o porta-voz e criou-se um padrão conhecido de todos. Alguns criam em sua mensagem e se regozijavam; outros a rejeitavam e provocavam oposição. Aconteceu pela primeira vez em Antioquia, depois em Icônio. Em Listra ele foi apedrejado e dado por morto (At 14:19), mas sobreviveu e pôde prosseguir até à cidade de Derbe.
A visita de Paulo e Barnabé a Derbe completou a sua primeira viagem. Logo Paulo resolveu percorrer de novo a difícil rota sobre a qual ele tinha vindo, a fim de fortalecer, encorajar e organizar os grupos cristãos que ele e Barnabé haviam estabelecido.
Nisto discernimos o plano de Paulo de estabelecer congregações nas principais cidades do Império. Ele não deixava seus convertidos desorganizados e sem liderança capaz, mas, pelo mesmo motivo, não permanecia muito tempo num só lugar.
Os judeus muitas vezes faziam convertidos entre os gentios, mas estes eram mantidos numa posição de “segunda classe”. A não ser que estivessem preparados para submeter-se à circuncisão e aceitar a interpretação da Lei segundo os fariseus, eles permaneciam à margem da congregação judaica. Mesmo que chegassem a esse ponto, o fato de não terem nascido judeus ainda os barrava de usufruir completa comunhão.
Assim, qual seria a relação dos convertidos gentios com a comunidade cristã? Paulo e Barnabé viajaram a Jerusalém a fim de conferenciar com os dirigentes ali a respeito desse problema fundamental.
Em Jerusalém, Paulo expôs as suas convicções e saiu vencedor. A descrição da controvérsia que o próprio Paulo apresenta aos gálatas declara que lhe estenderam “a destra de comunhão” e igualmente a Barnabé. Os dirigentes da igreja concordaram em que “nós fôssemos para os gentios” (Gl 2:9).
Após a conferência de Jerusalém, Paulo e Barnabé “demoraram-se em Antioquia, ensinando e pregando,.. . a palavra do Senhor” (Actos 15:35). Aqui, dois incidentes causaram severas tensões às relações de trabalho de Paulo com Pedro e Barnabé.
O primeiro desses incidentes surgiu dos mesmos problemas que provocaram a conferência de Jerusalém. A conferência havia liberado os gentios do regulamento judaico da circuncisão. Contudo, não havia decidido se os cristãos de origem judaica poderiam comer com os convertidos gentios. Pedro tomou posição ao lado de Paulo nessa praxe, o que envolvia relaxar os regulamentos dos judeus com vistas a alimentos. Na realidade, Pedro deu o exemplo comendo com gentios. Mais tarde, porém, ele “afastou-se e, por fim, veio a apartar-se” (Gl 2:12), e Barnabé se deixou levar “pela dissimulação deles” (v. 13).
Paulo, considerando esses actos como nova ameaça à sua missão entre os gentios, recorreu a uma medida drástica. “Resisti-lhe [a Pedro] face a face, porque se tornara repreensível” (Gálatas 2:11). Ele fez isso “na presença de todos” (v. 14). Em outras palavras, ele recorreu à censura pública.
Esse incidente ajuda-nos a entender o segundo, que Lucas registra em Atos 15:36-40. Barnabé desejava que o jovem Marcos os acompanhasse na segunda viagem missionária; Paulo opôs-se à ideia. E a narrativa diz que “houve entre eles tal desavença que vieram a separar-se” (v. 39).
Não sabemos se Paulo e Barnabé voltaram a encontrar-se. Eles concordaram em discordar” e empreenderam viagens, cada um para seu lado. Sem dúvida o evangelho foi desse modo promovido mais do que se tivessem permanecido juntos.
Então “Paulo, tendo escolhido a Silas, partiu[…]. E passou pela Síria e Cilícia, confirmando as igrejas” (Atos 15:40, 41). Depois de nova visita a Derbe, o último ponto visitado na primeira viagem, Paulo e seu grupo prosseguiram até Listra para ver seus convertidos nesta cidade. Aqui Paulo encontrou um jovem cristão chamado Timóteo (Atos 16:1), e viu nele um substituto potencial para Marcos.
O que aconteceu aqui redimiu Paulo de qualquer acusação de não se mostrar disposto a depositar confiança em homens mais moços do que ele. Em 1 Tm 1:2 dirigiu-se ao jovem Timóteo “verdadeiro filho”, e na segunda epístola fala dele como “amado filho” (2 Tm 1:2). Na segunda epístola lemos também: “pela recordação que guardo da tua fé, a mesma que primeiramente habitou em tua avó Lóide, e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também em ti” (2 Tm 1:5). Esta referência pode significar que a família de Timóteo fora ganha para Cristo por Paulo e Barnabé na sua primeira viagem. Por certo, quando Paulo voltou, ele quis que Timóteo “fosse em sua companhia” (At 16:3). Este mesmo versículo acrescenta que Paulo “circuncidou-o por causa dos judeus”. Era esta atitude coerente com o julgamento anterior de Paulo sobre Pedro? Ou se devia ao fato de ter ele aprendido a não criar problemas desnecessários? De qualquer modo, uma vez que Timóteo era meio-judeu, esta decisão evitaria problemas muitas vezes. Paulo sabia como lutar por um principio e como ceder por conveniência quando não estava em jogo nenhum princípio. Paulo sustentava que a circuncisão não era necessária à salvação (cf. Gálatas), mas estava pronto para circuncidar um judeu cristão como uma questão de conveniência.
Quando o grupo de evangelistas (dirigido de algum modo não especificado pelo Espírito Santo — At 16:6-8) chegou a Trôade e se pôs a contemplar o outro lado da estreita península, deve ter ponderado sobre a perspectiva de avançar sua campanha ao continente europeu. A decisão foi tomada quando “à noite, sobreveio a Paulo uma visão, na qual um varão macedónio estava em pé e lhe rogava, dizendo: Passa à Macedónia e ajuda-nos” (At 16:9). A resposta de Paulo foi imediata. O grupo navegou para a Europa. Muitos escritores têm sugerido que esse “varão macedónio” pode ter sido o médico Lucas. De qualquer maneira, parece que neste ponto ele entrou no drama de viagem, porque agora ele começa a referir-se aos missionários como “nós”.
A viagem continuou ao longo da grande estrada romana que corre para o Ocidente através das principais cidades da Macedónia — desde Filipos até Tessalónica, e de Tessalónica a Beréia. Durante três semanas, Paulo falou na sinagoga de Tessalónica; depois foi para Atenas, centro da erudição grega, e cidade onde dominava a idolatria (At 17:16). Incansável, ele partiu para Corinto.
Sua primeira e grande missão no mundo gentio estendeu-se por quase três anos. Depois ele voltou a Antioquia.
Após uma curta permanência em Antioquia, Paulo partiu em sua terceira viagem missionária no ano 52 d.C. Desta vez suas primeiras paradas foram na Galácia e na Frígia. Depois de visitar as igrejas em Derbe, Listra, Icónio e Antioquia, ele resolveu fazer algum trabalho missionário intensivo em Éfeso, a capital da província romana da Ásia. Estrategicamente localizada para comércio, era superada somente por Roma, Alexandria e Antioquia em tamanho e importância. Como resultado dos trabalhos de Paulo ali, ela tornou-se a terceira mais importante cidade na história do Cristianismo primitivo — Jerusalém, Antioquia, depois Éfeso.
Paulo chegou a Éfeso para empreender o que provou ser as mais extensas das suas actividades missionárias em qualquer localidade. Mas esses anos lhe foram estrénuos. Visto que ele sustentava a si próprio trabalhando em sua profissão, seus dias eram longos. Seguindo o costume dos trabalhadores de um clima tão quente, ele levantava-se antes de raiar o dia e começava a trabalhar. As horas da tarde ele as empregava no ensino e pregação, e é provável que também as horas vespertinas. Isto, ele fez “diariamente” durante “dois anos”. Em sua própria descrição desses trabalhos, Paulo acrescenta que ele não só ensinava em público, mas “também de casa em casa” (At 20:20). Teve êxito — muito bom êxito. Somos informados de “milagres extraordinários” (At 19:11) ocorridos durante esses dias agitados em Éfeso. A nova fé causou tal impacto sobre a cidade que “muitos dos que haviam praticado artes mágicas, reunindo os seus livros, os queimaram diante de todos” (At 19:19). Isso suscitou o ódio dos adoradores pagãos, temerosos de que os cristãos solapassem a influência de sua religião.
Depois de três invernos em Éfeso, Paulo passou o seguinte em Corinto, em concordância com a promessa e a esperança expressas em 1 Co 16:5-7. Ali Paulo fez outros preparativos para uma visita a Roma. Escreveu uma carta, dizendo aos cristãos de Roma: “Muito desejo ver-vos, … muitas vezes me propus ir ter convosco” (Rm 1:11, 13), e “penso em fazê-lo quando em viagem para a Espanha” (Rm 15:24).
Paulo ignorou as advertências sobre os perigos que o ameaçavam se ele aparecesse de novo em Jerusalém. Ele achava que era decisivo voltar em pessoa, como portador da oferta das congregações gentias. Ele estava “pronto não só para ser preso, mas até para morrer em Jerusalém, pelo nome do Senhor Jesus” (At 21:13). De modo que Paulo foi de novo a Jerusalém, e Lucas escreve que “os irmãos nos receberam com alegria” (At 21:17). Mas espreitando nas sombras estava uma comissão de recepção com intenções diferentes.
segunda-feira, 14 de junho de 2010
O CONCEITO DE BELEZA, REFLECTINDO A PARTIR DA ENCARNAÇÃO E CRUCIFICAÇÃO DO VERBO COMO PROCESSO QUENÓTICO, SEGUNDO EF. 1, 6-9.
A reflexão teológica procura dar uma resposta, mesmo na consciência de seu limite, à situação angustiante do pensamento de sua época. Parece que a exaltação da razão, da ciência e do material, impõem como bom e verdadeiro aquilo que é triunfal, grande e vencedor. Por conseguinte, desenha-se uma estética se muita ética. No entanto, entre o “bom” e o “belo” surge uma crise. Emerge então a questão: tudo que é considerado belo é bom?
Até quando os aspectos exteriores são determinantes? O que é o belo? A perspectiva cristã projecta uma luz diferente. A beleza é algo antigo e novo, sua dinâmica de contradição e negação apontam para algo maior. A cruz de Jesus pode ser a chave para a revisão do conceito de beleza onde estética e ética se afinam.
O tema clássico da quênose na crucificação de Jesus ocupa um lugar importante na discussão da estética teológica. Geralmente não se vê beleza na derrota, na impotência e na forma desfigurada do crucificado. Há, contudo, uma beleza que se esconde por trás do véu da feiúra. É preciso descobrir a riqueza da ética que resultará de uma estética que rompe com as formas aparentes e se revela bela na contradição.
A beleza pode estar na possibilidade daquilo que é grande manifestar-se no que é pequeno, Daquele que é poderoso, sofrer a dor humana da humilhação e da morte. A beleza poderá estar então, na quênose, como manifestação da grande solidariedade de Deus pelo gênero humano, como sentimento de amor capaz de rebaixamento e esvaziamento. Dessa forma, torna-se necessária a reconstrução do conceito de beleza e também de uma nova estética teológica, em vista de uma ética mais autêntica da fé cristã.
Dentre as tantas definições da palavra beleza, buscamos extrair um de seus significados no mundo religioso. Beleza pode ser entendida como o lugar onde Deus brilha, a glória de Deus que manifesta seu esplendor na boa convivência com os seres criados. A beleza seria a expressão do bem e o bem a condição para sua existência. Entendida desta forma, como esplendor da verdade, ela se opõe ao falso, ao ilusório, à mentira. Então, verdade, belo e boa seria sinônimos e, ao mesmo tempo, atributos da beleza. Para o mundo cristão, a mais sublime e bela manifestação de Deus foi sua “descida”ou sua encarnação. A possibilidade de Deus tomar forma humana, de conversar, de calar, de sofrer, de sorrir ou chorar, constitui-se beleza infinita. O auge dessa trajectória verifica-se no evento da cruz. O Deus belo em Jesus renuncia ao triunfo, à potência, à glória. Na cruz acontece uma inversão de valores, ou uma valoração daquilo que tem valor: o amor. A glória de Deus compreende-se no evento da cruz. Aí compreende-se então em que consiste a quênose de Jesus: “Ele tinha a condição divina, mas não se apegou a sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de servo e tornando-se semelhante aos homens. Assim, apresentando-se como simples homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz! (Ef 1,6-9)
O ressuscitado é o crucificado. Deus exaltou a beleza do amor de Jesus. Então o amor é belo, capaz de tudo crer, desculpar, perdoar e jamais acabar, conforme afirma Paulo na primeira carta aos Coríntios. O véu quenótico que cobre o esplendor de Deus, manifesta na cruz a grandeza do amor que assume a enfermidade humana para resgatá-la. A deformação de Jesus enquanto corpo, enquanto vida, enquanto projectos, na verdade é o triunfo da beleza do amor que passa por torturas para chegar à libertação e auge da alegria.
A beleza instrumentalizada pode ofuscar a beleza que realmente brilha.
Éfeso: Um Estudo Histórico-Cultural e Contextual
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A Religião de Éfeso
Como todos os centros comerciais, Éfeso provia uma atmosfera cosmopolita, combinando as culturas grega e romana. A cidade também era um centro de adoração e atraía grande número de peregrinos e seguidores religiosos..
O culto de Ártemis em Éfeso era anterior ao povoamento grego em Éfeso; o próprio nome Ártemis não é grego. A deusa era tradicionalmente venerada como protetora das criaturas selvagens. Essa associação com as criaturas selvagens sobreviveu, de uma forma alterada, em sua adoração em terras gregas como “a rainha e caçadora, vigem e justa.” A Ártemis de Éfeso, por outro lado, parece ter adquirido algumas características da grande deusa-mãe venerada desde o tempo imemorial na Ásia Menor.
Segundo Fant e Reddish, os nativos adoravam a deusa Cibele. Os colonos gregos assimilaram a religião regional e identificaram Cibele com a deusa grega Ártemis, a caçadora virgem. Os romanos, posteriormente, identificaram Ártemis com Diana.
Ártemis era uma antiga deusa de associações mistas. Ela estava identificada com a fertilidade e nascimento. Mesmo que fosse adorada muito tempo antes da dominação grega ou romana, seu culto eventualmente se fundiu com sua contraparte romana Diana, sendo conhecida como a deusa da caça e da lua.
Éfeso tornara-se um ponto de miscigenação racial, um centro comercial cosmopolita do Império, e um campo de batalha religioso. De acordo com Couch, a divindade ali adorada, antes de se tornar conhecida como Ártemis, era a Astarote dos fenícios. Independente da versão, essa deusa da fertilidade era adorada com prostituição legalizada, subsídios comercializados e um maravilhoso templo.
O culto a Ártemis era marcado por zelo missionário e se espalhou para o ocidente. A deusa competiu com o cristianismo primitivo em sua missão universal, provendo até mesmo revelação por sonhos para o crescimento do seu culto. Lucas descreve a missão em Éfeso como sendo inspirada por sonhos e visões (Atos 2:17; 9:10; 10:10; 16:9; 18:9; 23:11).
A idolatria e a imoralidade eram tão más em Éfeso que a cidade foi apelidada de arch paganismi, “o cúmulo do paganismo.” O Templo de Ártemis iniciou um badalado centro de manufactura de ídolos. Prostitutas e pornografia eram o próximo item básico oferecido aos peregrinos e turistas.
Para os efésios, o templo e a adoração à Ártemis representavam oportunidades econômicas tanto quanto orgulho cívico Éfeso também era um centro de aprendizado e prática de artes mágicas e práticas ocultas. O povo acreditava em amuletos, poções, palavras mágicas e feitiços.
Mesmo entre os efésios praticantes de magia o evangelho provou seu poder. Muitos deles acreditavam, e vieram até Paulo e seus companheiros missionários, confessando seus sortilégios e revelando seus feitiços. De acordo com a teoria mágica, a potência de um feitiço estava ligado ao seu segredo; se fosse divulgado, se tornava ineficaz. Então estes magos convertidos renunciaram seu poder imaginário ao tornar seus feitiços inoperantes. Muitos deles também reuniram seus papiros mágicos e fizeram uma fogueira com eles. Alguns desses rolos mágicos sobreviveram até nossos dias. A conexão especial de Éfeso com a mágica é reflectida pelo termo “cartas dos efésios” para os rolos mágicos
Porquê a minha escolha?
Mas não queria deixar de dizer o porquê da minha escolha. Acho impressionante como em tão poucas palavras S. Paulo (ou o seu autor), descreve o mistério pascal e, no fundo, aquilo para o qual o cristão é chamado. De facto, nós, que somos tornados Santos pelo baptismo, somos chamados a fazer-nos "tudo para todos", descendo até onde for preciso em auxílio dos nossos irmãos.
Sempre me ensinaram que os cristãos não ajudam, mas servem os outros. Isto porque aquele que ajuda, considera-se numa poisição superior e rebaixa-se para ajudar os "coitados", muito distantes de si. Mas se virmos com atenção o que foi a vida de Jesus, reparamos que Ele não fez de conta que era homem, mascarando a sua divindade, mas assumiu verdadeiramente a condição humana, para assim poder resgatar o homem da morte e do pecado. De facto, aquele que serve está já em baixo e trata os outros com respeito, com toda a consideração e solicitude. Os que servem não fingem que estão ao mesmo nível dos pequenos, sentindo-se interiormente mais acima: os que servem fazem-se verdadeiramente humildes, humilham-se "até à morte, e morte de Cruz". Tendo, por isso, como recompensa, a vida eterna, a glorificação.
O Hino Cristológico de Fil 2, 5-11
5Tende entre vós os mesmos sentimentos, que estão em Cristo Jesus:
6Ele, que é de condição divina,
não considerou como uma usurpação ser igual a Deus;
7no entanto, esvaziou-se a si mesmo,
tomando a condição de servo.
Tornando-se semelhante aos homens
e sendo, ao manifestar-se, identificado como homem,
tornando-se obediente até à morte
e morte de cruz.
9Por isso mesmo é que Deus o elevou acima de tudo
e lhe concedeu o nome
que está acima de todo o nome,
se dobrem todos os joelhos,
os dos seres que estão no céu,
na terra e debaixo da terra;
"Jesus Cristo é o Senhor!",
para glória de Deus Pai.