segunda-feira, 14 de junho de 2010

O CONCEITO DE BELEZA, REFLECTINDO A PARTIR DA ENCARNAÇÃO E CRUCIFICAÇÃO DO VERBO COMO PROCESSO QUENÓTICO, SEGUNDO EF. 1, 6-9.

A reflexão teológica procura dar uma resposta, mesmo na consciência de seu limite, à situação angustiante do pensamento de sua época. Parece que a exaltação da razão, da ciência e do material, impõem como bom e verdadeiro aquilo que é triunfal, grande e vencedor. Por conseguinte, desenha-se uma estética se muita ética. No entanto, entre o “bom” e o “belo” surge uma crise. Emerge então a questão: tudo que é considerado belo é bom?

Até quando os aspectos exteriores são determinantes? O que é o belo? A perspectiva cristã projecta uma luz diferente. A beleza é algo antigo e novo, sua dinâmica de contradição e negação apontam para algo maior. A cruz de Jesus pode ser a chave para a revisão do conceito de beleza onde estética e ética se afinam.

O tema clássico da quênose na crucificação de Jesus ocupa um lugar importante na discussão da estética teológica. Geralmente não se vê beleza na derrota, na impotência e na forma desfigurada do crucificado. Há, contudo, uma beleza que se esconde por trás do véu da feiúra. É preciso descobrir a riqueza da ética que resultará de uma estética que rompe com as formas aparentes e se revela bela na contradição.

A beleza pode estar na possibilidade daquilo que é grande manifestar-se no que é pequeno, Daquele que é poderoso, sofrer a dor humana da humilhação e da morte. A beleza poderá estar então, na quênose, como manifestação da grande solidariedade de Deus pelo gênero humano, como sentimento de amor capaz de rebaixamento e esvaziamento. Dessa forma, torna-se necessária a reconstrução do conceito de beleza e também de uma nova estética teológica, em vista de uma ética mais autêntica da fé cristã.

Dentre as tantas definições da palavra beleza, buscamos extrair um de seus significados no mundo religioso. Beleza pode ser entendida como o lugar onde Deus brilha, a glória de Deus que manifesta seu esplendor na boa convivência com os seres criados. A beleza seria a expressão do bem e o bem a condição para sua existência. Entendida desta forma, como esplendor da verdade, ela se opõe ao falso, ao ilusório, à mentira. Então, verdade, belo e boa seria sinônimos e, ao mesmo tempo, atributos da beleza. Para o mundo cristão, a mais sublime e bela manifestação de Deus foi sua “descida”ou sua encarnação. A possibilidade de Deus tomar forma humana, de conversar, de calar, de sofrer, de sorrir ou chorar, constitui-se beleza infinita. O auge dessa trajectória verifica-se no evento da cruz. O Deus belo em Jesus renuncia ao triunfo, à potência, à glória. Na cruz acontece uma inversão de valores, ou uma valoração daquilo que tem valor: o amor. A glória de Deus compreende-se no evento da cruz. Aí compreende-se então em que consiste a quênose de Jesus: “Ele tinha a condição divina, mas não se apegou a sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de servo e tornando-se semelhante aos homens. Assim, apresentando-se como simples homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz! (Ef 1,6-9)

O ressuscitado é o crucificado. Deus exaltou a beleza do amor de Jesus. Então o amor é belo, capaz de tudo crer, desculpar, perdoar e jamais acabar, conforme afirma Paulo na primeira carta aos Coríntios. O véu quenótico que cobre o esplendor de Deus, manifesta na cruz a grandeza do amor que assume a enfermidade humana para resgatá-la. A deformação de Jesus enquanto corpo, enquanto vida, enquanto projectos, na verdade é o triunfo da beleza do amor que passa por torturas para chegar à libertação e auge da alegria.

A beleza instrumentalizada pode ofuscar a beleza que realmente brilha.

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